Arrastava-se pelos cantos da casa, fungando a poeira das cortinas e o cheiro doce das rosas na varanda. Ábia cheirava paredes, copos e lençóis, em busca de um resto do cheiro do poeta Novelliqué. Nos últimos dias, as paredes vizinhas já não estavam mais mudas. Essas finas paredes de gesso permitiam que Ábia ocupasse o tempo, imaginando como seria o novo vizinho. Algumas vezes, debruçava-se na varanda à procura de encontrá-lo. Alto, baixo, tímido ou desbocado, judeu ou agnóstico, alérgico e asmático, não importava como era o homem. Ela gostaria de vê-lo, do modo que ele quisesse aparecer.
Em alguns dias, Ábia voltou a atuar no teatro, cortou os cabelos e flertou com todos os homens da cidade (desde o bancário, gordo e simpático, ao padre de missas maciças, jovem e empoeirado pela batina branca bordada a ouro). De qualquer modo, Ábia gostaria de ver o novo vizinho. Esperava encontrá-lo vestido de terno e gravata, apressado no elevador, de bermuda jeans, esguichado na varanda, de tênis e bermudas largas, na volta de um passeio com o cachorro. Anciosa, Ábia apressou-se, deixou-lhe um cartão de boas-vindas, "Seja você quem for. Espero-te as nove, na entrada do prédio", dizia o cartão.
Em alguns dias, Ábia voltou a atuar no teatro, cortou os cabelos e flertou com todos os homens da cidade (desde o bancário, gordo e simpático, ao padre de missas maciças, jovem e empoeirado pela batina branca bordada a ouro). De qualquer modo, Ábia gostaria de ver o novo vizinho. Esperava encontrá-lo vestido de terno e gravata, apressado no elevador, de bermuda jeans, esguichado na varanda, de tênis e bermudas largas, na volta de um passeio com o cachorro. Anciosa, Ábia apressou-se, deixou-lhe um cartão de boas-vindas, "Seja você quem for. Espero-te as nove, na entrada do prédio", dizia o cartão.
Por conta da demora no recebimento de alguma reposta sobre o encontro forçado, de um modo inesperado, as antigas dores intestinais voltaram a perturbar o sono da mulher. Por conta da angústia, Ábia desmaiava em braços estranhos.
Aquela falta de resposta sobre a verdadeira identidade do rapaz, fazia com que os pensamentos de Ábia girassem em torno de concepções apressadas. Santificou-o de tal maneira, que não lhe agradava a idéia de que o novo vizinho poderia se tratar de um bruto! Que os lindos vasinhos de orquídeas expostos na varanda fossem, talvez, presente de uma antiga namorada, uma mulher de grandes seios e ancas largas, a qual o homem só se lembrava a meia- noite, referindo-se a moça por palavras obscenas e excitantes. Eram palavras disparadas em bom tom para que Ábia soubesse que ele se tratava de um total cafajeste e se o quisesse seria daquele jeito, apenas na hora da agonia.
Ábia, por três noites, caiu em prantos. Desesperou-se com as lembranças que do poeta Novelliqué. Gastou as noites contaminando-se de pensamentos podres sobre o novo vizinho. Desistiu dos encontros forçados, desistiu do homem que lhe causava vômitos repentinos e tonturas constantes. A partir de então, colocou-se meio a uma fuga desesperada, passou a sair mais cedo de casa e a demorar na volta do trabalho. Após duas semanas, Ábia observou que, jogado junto as flores na varanda, havia um recado amarrotado, onde se dizia: "Desculpe não ter aparecido. Ocorreu-me um imprevisto. Te espero hoje, às oito da noite, sem falta".
Ábia enlouqueceu de aflição. Foi tomada por um medo devasso ao pensar na possibilidade de encontrar-se com o homem das orquídeas. Era como se o estado contemplativo de observar as pessoas sob uma ótica íntima e egoísta fosse mais prazeroso do que encarar o amor cara a cara. Talvez, por medo da considerável chance de decepção, acovardou-se, resolveu não ir.
Ábia, por três noites, caiu em prantos. Desesperou-se com as lembranças que do poeta Novelliqué. Gastou as noites contaminando-se de pensamentos podres sobre o novo vizinho. Desistiu dos encontros forçados, desistiu do homem que lhe causava vômitos repentinos e tonturas constantes. A partir de então, colocou-se meio a uma fuga desesperada, passou a sair mais cedo de casa e a demorar na volta do trabalho. Após duas semanas, Ábia observou que, jogado junto as flores na varanda, havia um recado amarrotado, onde se dizia: "Desculpe não ter aparecido. Ocorreu-me um imprevisto. Te espero hoje, às oito da noite, sem falta".
Ábia enlouqueceu de aflição. Foi tomada por um medo devasso ao pensar na possibilidade de encontrar-se com o homem das orquídeas. Era como se o estado contemplativo de observar as pessoas sob uma ótica íntima e egoísta fosse mais prazeroso do que encarar o amor cara a cara. Talvez, por medo da considerável chance de decepção, acovardou-se, resolveu não ir.
por Tainá Falcão
5 comentários:
Ah, Ábia, vá! :] mesmo que a verdade seja menos interressante que as suas conjecturas, eu duvido que o mistério termine se você não quiser que termine. Afinal não existe amanhã. :] e eu tenho que te contar a história de uma moça e um cometa.
"a vida amigo, é a arte do encontro, embora haja tanto desencontro pela vida".
o desejo e o medo não rimam por acaso. assim como a dor e o amor.
Lindo querida.
Mundo da idéias platônicas! Mas do que adianta manter algo que se deseja nele, se vc não pode entrar? A única resposta que me vem a cabeça seria: por complexo de inferioridade, pois, põe-se algo dentro de um mundo melhor que o seu, ou seja, em um patamar acima do seu, o qual sabe que, nesta vida, não entrará.
Eu consigo imaginar uma esfera perfeita, porém, por mais redonda que eu faça uma esfera, ela jamais será perfeita(totalmente redonda)(comprovadamente).
é... Ábia carrega o medo de todos nós. Difícil decisão.
muito bom, fodástico!
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