terça-feira, 12 de junho de 2007

Helena, de recatada a feminista.

Helena, por sua vez, viveu inteiramente recatada sob as ordens do marido. Nas ruas da cidade, apresentava-se, quase sempre, coberta por anáguas e babados delicados.
Casou-se com um verdadeiro beberrão. Ao fim da tarde, quando aparecia em casa, o homem exalava o álcool de seu próprio corpo. Numa mistura de suor ardente e pinga salgada, costumava miar feito gato desolado em busca de colo. A mulher enchia-se de vergonha quando o marido e suas mãos ásperas, cheias de calo, deslizavam-se por dentro de suas pernas acanhadas e ele logo lhe forçava um beijo apressado, como quem devorava uma manga madura.
Helena jurava um dia esmagar-lhe os miolos e livrar-se de uma vez daquela agonia. Não houve porque esperar muito tempo: dito e feito, como premeditou a mulher. O ato foi de tanta meticulosidade que os curiosos da cidade juraram que o marido, mulherengo que era, havia se metido em anáguas alheias e por isso, levou um tiro certeiro no meio da testa de modo que lhe fez o cérebro fugir corrido pelas ventas.
No velório a viúva - não se sabe se por vandalismo ou arrependimento- vestiu-se com as roupas do falecido, deixou os pêlos de todo o corpo crescer e proclamou o hino feminista com as mãos apontadas ao céu. A ousada atitude a fez parecer insana aos olhares das dondocas. Quanto ao resto, tornou-se a única mulher temida como o “Demo” pelos machões do povoado.

por Tainá Falcão

Um comentário:

Minduim disse...

É... Ouvi, não sei onde, que mulher de revolucionário é a revolução (Geralmente eles “lutam contra o pai autoritário” e se derretem “com a mãe que se casam” – a esposa). Marido de revolucionária parece que segue a mesma linha.
E, no final, mais uma dose de uma mulher “perdida” de sua essência!
É engraçado, mas eu imagino todo o colorido de filmes espanhóis em teus textos! Hehe =D~